Transcrição parcial de A liberdade não é grátis, Luís Campos e Cunha, Público, 08.02.2008
«Mas, no actual estado de coisas, aqui como lá fora, retira-se a responsabilidade moral de não
fumar para não incomodar o próximo, para se passar à proibição da existência do ser imperfeito, ou seja, do fumador. Daí chega-se à raça superior, que hoje não vem dos genes, mas da proibição e do politicamente correcto consagrado em lei. A possibilidade de errar está proibida e, dentro em pouco, não frequentar um ginásio da moda será tão grave como fugir ao fisco. (…) O único limite à liberdade de cada um é, obviamente, o espaço de liberdade dos outros, que deve ser igual ao meu.
Para já, são pequenas liberdades que estão em causa. Os ataques às liberdades foram fruto da demagogia e do politicamente correcto, mas uma outra linha de ataque à liberdade é bem mais grave e, supostamente, em defesa da liberdade.
As escutas telefónicas (hipotéticas ou reais), as negociatas, os dossiers sobre pessoas, as câmaras de vigilância (legais ou não), minam a confiança e turvam o ambiente de liberdade. Paira permanentemente a suspeição sobre todo e qualquer cidadão. Ele sente isso e, como tal, não é livre.
Para se ter, hoje, a privacidade de há 15 anos só seria possível com um comportamento de psicopata, fugindo das auto-estradas, não usando multibancos, cartões de crédito ou contas bancárias; não entrando em supermercados ou centros comerciais... Tal comportamento seria de tal modo custoso para o próprio e seria socialmente de tal modo estranho que certamente chamaria a atenção de algum bufo, o que justificaria algum inquérito, naturalmente. A privacidade acabou, dentro em pouco será o ataque à intimidade.
E tudo isto em defesa da liberdade. Se tal não for atalhado e a corrida para o abismo não parar, os terroristas podem reformar-se, pois os democratas entretanto fizeram o trabalho por eles.»
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